Mesmo com as campanhas de conscientização, os famosos trotes continuam sendo praticados, prejudicando os serviços de urgência e emergência de Alagoas. O mais recente foi registrado na sexta-feira (6), quando uma ligação entrou no sistema 192 do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), e o solicitante informou que ele e um amigo tinham sofrido uma queda de moto e essa segunda vítima estaria descordada.
O suposto acidente teria acontecido na BR-104, entre os municípios de Branquinha e União dos Palmares, Zona da Mata alagoana. Pela gravidade da situação, a regulação médica decidiu liberar o helicóptero do Serviço Aeromédico e a Unidade de Suporte Básico (USB) da Base Descentralizada de Murici, além de acionar a Polícia Rodoviária Federal (PRF), pela suposta ocorrência ser em uma rodovia federal.
Segundo Mayara Tavares, enfermeira e coordenadora da Base Descentralizada de Murici, a equipe da USB chegou até o local da ocorrência e constatou de que não havia nenhum acidente e que havia sido um trote. “Não demoramos 10 minutos para chegar no suposto local do acidente. Não verificamos nenhum sinal que pudesse sugerir que a queda de moto realmente tinha acontecido. Procuramos e não vimos o veículo, não tinha sangue na rodovia e ainda percorremos aproximadamente uns 20 km, até a cidade de União do Palmares, procurando as vítimas e não achamos nada. O sentimento que fica é de revolta e tristeza, porque podemos deixar de atender alguém que realmente precisa do serviço, além de arriscarmos nossas vidas a cada ocorrência”, relatou a enfermeira.
A PRF também percorreu a BR-104, no trecho indicado pelo solicitante, e não achou nenhum sinal do acidente. Os policiais foram até um hospital local de União dos Palmares e nenhuma vítima de acidente de motocicleta tinha dado entrada na unidade.
Outra equipe do Samu Alagoas deslocada para a ocorrência foi a do Serviço Aeromédico. Para o médico Marcos Viana, essa brincadeira de mal gosto pode acabar custando a vida de outras pessoas, que estão precisando realmente de um atendimento de urgência e emergência naquele momento.
“Quando fomos acionados para essa ocorrência, saímos o mais rápido possível. Sobrevoamos pela extensão da BR-104, chegando até a cidade de União dos Palmares, e nada da ocorrência. Então, percebemos que deveria ser um trote, uma atitude irresponsável e triste, e por causa dessa brincadeira de mal gosto, acabamos deixando uma grande área sem a cobertura”, salientou.
“Se naquele momento acontecesse um acidente de trânsito grave, um afogamento, uma suspeita de infarto ou de AVC, existia o grande risco dessas pessoas morrem. A população alagoana ficou sem o atendimento dessas duas equipes, porque estávamos preocupados em socorrer as vítimas dessa falsa ocorrência. Queremos sempre salvar todas as pessoas que precisam desse atendimento de urgência e emergência, e a população não pode ser prejudicada por conta dessas pessoas que insistem em fazer esse tipo de brincadeira”, lamentou o médico.
Com a dificuldade em achar as vítimas da provável ocorrência, a Central de Regulação de Maceió, entrou em contato com o solicitante, mas o número telefônico estava desligado. De acordo com Luiz Antônio Mansur, médico regulador do Samu Alagoas, devido ao tipo da ocorrência, foi necessário fazer a liberação rápida das equipes para poder salvar aquelas supostas vítimas.
“Estou há 17 anos no Samu Alagoas, e essa foi a primeira vez que liberei viaturas para uma ocorrência falsa. Quando conversei com o solicitante, não notei nada de anormal no tom de voz, ou qualquer outro sinal que demonstrasse que aquela ligação fosse um trote. O rapaz relatou que a vítima mais grave estava inconsciente e, por ser um acidente em uma rodovia, liberamos o helicóptero, que é uma UTI aérea, e a ambulância de Murici, para chegarmos mais rápido, avaliarmos o paciente e tentarmos estabilizar a vítima”, destacou Luiz Antônio Mansur.
“É triste saber que as pessoas continuam insistindo em passar trotes para o Samu, que é um serviço essencial, e que lida diretamente com vidas. Caso alguém não tenha um atendimento rápido, pela falta das viaturas que estão se deslocando para um trote, pode significar a morte desse paciente”, afirmou o médico.
Trotes em 2020 – As Centrais de Regulação de Maceió e de Arapiraca do Samu Alagoas receberam, entre os meses de janeiro e outubro, 324.266 ligações no número 192. Desse total, os trotes representam 109.047 chamadas, ou seja, 33,62% das ligações.
O artigo 266 do Código Penal Brasileiro classifica como crime passar trote para serviços de emergência, e a pessoa que faz esse tipo de ligação pode pegar de um a seis meses de detenção. O infrator também pode ser condenado a pagar uma multa, e as penalidades podem ser duplicadas em situações de calamidade pública.
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