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Luan Moraes

Sobre o autor

Possui graduação em História pela Universidade Estadual de Alagoas, especialização em Gestão e Coordenação Pedagógica pela Faculdade São Tomás de Aquino e mestrado em História Social pela Universidade Federal de Alagoas.
Postada em 30/08/2025 15:25

Além da tragédia: a violência escolar no Brasil e o imperativo de reconstruir a confiança

Respostas efetivas exigem ir além das medidas de segurança e investir em políticas de gestão de conflitos, saúde mental e recomposição do vínculo entre escola, família e sociedade.

A onda de violência extrema dentro das escolas brasileiras, infelizmente, deixou de ser um evento isolado para se tornar um fenômeno social complexo e urgente. Os últimos meses foram marcados por uma sequência de ataques e ameaças que colocaram em choque pais, alunos e toda a comunidade educacional, exigindo uma reflexão profunda sobre as causas e, principalmente, sobre as saídas possíveis.
Este não é um problema com uma única causa ou uma solução simples. Ele é multifacetado, envolvendo desde a disseminação de ideias violentas online até a crise de saúde mental entre jovens e a erosão dos laços sociais.

Casos que abalaram o país

  1. Escola Estadual Thomazia Montoro (São Paulo - SP), 27 de Março de 2023: Um ataque a facas resultou na morte da professora Elizabeth Tenreiro, 71 anos, e feriu outras cinco pessoas. O agressor, um adolescente de 13 anos, era aluno da escola e agiu com precisão e frieza. Investigações apontam que ele era um "perfil solitário", vítima de bullying, e que planejou o ataque inspirado por um caso similar ocorrido em 2011 em Realengo, RJ. O caso chocou pelo fato de o agressor ser extremamente jovem e pelo alvo ser uma educadora, símbolo da comunidade escolar.
  2. Creche Cantinho Bom Pastor (Blumenau - SC), 5 de Abril de 2023: Em um dos episódios mais brutais, um homem de 25 anos invadiu a creche e matou quatro crianças a machadadas, além de deixar outras cinco feridas. O atacante, que não tinha vínculo com a instituição, cometeu suicídio após o crime. A tragédia em Blumenau acendeu um debate crítico sobre a segurança física das escolas, especialmente as de educação infantil, consideradas até então um santuário inviolável.
  3. Escola Estadual Professor Raul Brasil (Suzano - SP), 13 de Março de 2019: O caso de Suzano permanece como um marco e um ponto de partida para a discussão contemporânea. Dois ex-alunos, um de 17 e outro de 25 anos, invadiram a escola armados com pistola, arco e flecha e machados, matando cinco estudantes e duas funcionárias, antes de se suicidarem. Eles eram integrantes de um grupo online que venerava outros massacres, como o de Columbine, nos EUA. Este caso expôs com clareza a influência de fóruns de ódio na internet na radicalização de jovens.

Análise de um professor: para além dos muros da escola

Atuando como professor por mais de 10 anos e com experiência e especialização em gestão escolar, acredito que a resposta não pode se resumir a mais câmeras ou policiamento. Fortalecer os vínculos humanos dentro da escola é a medida de segurança mais poderosa que existe. Deste modo, com base em minha experiência em coordenação pedagógica, é possível apontar três eixos fundamentais para a prevenção:

  1. Gestão democrática e canal de comunicação: A escola precisa ser um ambiente onde o aluno se sinta ouvido, acolhido e parte de uma comunidade. Comitês de mediação de conflitos, assembleias escolares e a figura do professor-tutor são essenciais para identificar problemas como bullying, isolamento e sofrimento mental antes que eles evoluam para uma tragédia.
  2. Formação continuada para corpo docente e funcionários: Professores e funcionários estão na linha de frente. Precisamos capacitá-los para identificar sinais de alerta, não apenas de violência, mas de depressão, ansiedade e radicalização. Saber como agir e para quem encaminhar é crucial. Isso também inclui protocolos claros de emergência. Boas formações, que não foquem em motivação e atividades inúteis, deveriam servir a este propósito.
  3. Parceria escola-família-saúde pública: A escola sozinha não dá conta. É imperativo criar redes de proteção efetivas com postos de saúde, CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) e conselhos tutelares. A família precisa ser atraída para dentro da escola, não apenas quando há um problema disciplinar, mas como parceira ativa na educação e no cuidado dos jovens.

O papel da internet e a responsabilidade das plataformas

A multiplicidade de casos de violência escolar torna evidente o papel da internet como catalisadora da violência. O acesso a conteúdo violento, a glorificação de criminosos e a existência de fóruns sem moderação em redes menos reguladas são um terreno fértil para mentes vulneráveis. Especialistas cobram maior responsabilidade das plataformas digitais na fiscalização ativa desse conteúdo e uma discussão séria sobre educação digital nas escolas, ensinando os jovens a navegarem criticamente e a identificarem discursos de ódio.

Conclusão: Um Chamado para a Ação Coletiva

As trágicas cenas de violência nas escolas são um sintoma de uma doença social mais ampla. A solução, portanto, não pode ser apenas punitiva ou reativa. Ela exige um projeto de reconstrução.
Para concluir, afirmo: Estamos diante de um desafio que exige coragem para repensar nosso modelo de escola. Precisamos construir uma escola que não apenas ensine matemática e português, mas que eduque para as emoções, para a empatia e para a resolução não-violenta de conflitos. É um trabalho difícil e de longo prazo, mas a vida de nossas crianças e educadores depende dessa escolha.

A pergunta que fica para toda a sociedade é: estamos prontos para investir nessa reconstrução?

O site Todo Segundo não se responsabiliza pelos conteúdos publicados nos blogs dos seus colaboradores.
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